Hezrom Vieira Costa Lima

VITÓRIA DE DOMINAÇÃO: SIMULAÇÃO DE GUERRA E PODER DO IMPÉRIO ASSÍRIO EM CIVILIZATION V

Introdução
No ano 1550 AEC. o Rei Assurbanipal, ocupando o trono do Império Assírio, envia exércitos para ampliar os seus domínios.Partindo da cidade de Assur, as tropas cruzam o rio e marcham seguindo em direção ao nordeste. A grande vantagem é que estes possuem,em seu domínio,a tecnologia de uma torre de cerco, uma máquina de combate que é completamente desconhecida pelos inimigos.O domínio da região será mantido e mais uma vez o poder do império assírio será demonstrado por meio da guerra.

A cena descrita acima não está presente em nenhum relevo que adornava os palácios dos reis Assírios ou em uma placa de argila de escrita cuneiforme, mas sim em um Jogo Eletrônico, o qual coloca o jogador no controle de um império e, através das decisões tomadas, fará com que o nome do seu império seja lembrado ou esquecido.


Fig. 1 – Simulando o domínio do Império Assírio em Civilization V

A virada do presente século aponta um novo perfil para o conhecimento do passado, os Jogos Eletrônicos com conteúdo histórico.Nos últimos anos, os Jogos Eletrônicos passaram por uma metamorfose, sendo transformados de um meio de entretenimento para uma forma cotidiana de conhecimento (ROMERA; OJEDA, 2015).

E como destaca Chartier(2010, p.21): “As obras de ficção, ao menos alguma delas, e a memória, seja ela coletiva ou individual, também conferem uma presença ao passado, às vezes ou amiúde mais poderosa do que a que estabelecem os livros de história”

Kapell e Elliott (2013) destacam que as possibilidades de simulação do passado, como jogos eletrônicos e museus digitais, têm se tornando objeto de estudo por historiadores. O conhecimento sobre o passado é perpassado tanto pelas discussões tecidas no campo acadêmico, materializados pela historiografia, como também por outros suportes que apresentam um conhecimento sobre o passado, como a memória e a mídia.A primeira entendida não apenas como uma manifestação biológica, mas sobretudo na sua forma social, e a segunda percebida nos seus mais variados suportes, como escrita, televisiva e digital.

Nesse sentido, o presente artigo segue a linha teórica acima proposta, visando analisar, de maneira específica, como o Império Assírio é simulado digitalmente dentro do jogo Civilization V – apresentando algumas características que remetem a manifestações de guerra e poder, e, em um aspecto mais geral, como os Jogos Eletrônicos simulam o passado, percebendo as aproximações e distanciamentos presentes nos jogos no tocante a historiografia.

Fase 1: Apresentando o jogo Civilization V
Civilization V é um jogo de estratégia por turnos, desenvolvido pela Firaxis Games e publicado pela 2K Games, lançado mundialmente em setembro de 2010. O jogador assume o controle de um povo, personificado através do avatar de um líder, devendo administrar recursos, desenvolver pesquisas científicas, gerenciar exércitos, incentivar o aumento populacional, tecer relações diplomáticas e impulsionar a economia, ampliando seu domínio para alcançar a vitória.

Como o próprio nome sugere, Civilization V é o quinto jogo da franquia “Sid Meier’s Civilization”, iniciada em 1991 e contando atualmente com seu 6º título, lançado em outubro de 2016. Civ 5 possui duas expansões, Gods& Kings [Deuses e Reis], lançado em fevereiro de 2012 e Brave New World [Admirável Mundo Novo], lançado em março de 2013, os quais transformaram a dinâmica do jogo e acrescentaram outros povos como nações jogáveis.

No jogo original existem 25 líderes e suas respectivas nações controláveis dentro do jogo, cada um com uma unidade e um tipo de tecnologia próprias. Além disso, foi o primeiro jogo da série a introduzir uma nova dinâmica, as cidades-estados, que são entidades políticas independentes que podem ser aliadas ou conquistadas pelo jogador. A primeira expansão, G&K, introduz 2 novos tipos de Cidades-Estados, Religiosa e Mercantil, e também 9 civilizações e seus respectivos líderes, além de 27 novas unidades, 13 novas estruturas, bem como outros recursos e tecnologias. A segunda expansão, BNW, também acrescenta 9 civilizações e seus respectivos líderes, 8 novas maravilhas, 2 cenários, 4 modos de jogo e outros recursos. Nessa última expansão, foi acrescentado a civilização Assíria, que pode ser comandada pelo rei Assurbanipal.

Iniciando com dois grupos de unidades recém-saídos do período neolítico, um pequeno grupo de aldeões e um grupo de soldados, o jogador deve fundar uma cidade e, administrando os recursos disponíveis, adquirir conhecimento sobre técnicas que garantirão a sobrevivência desse povo e o domínio dos recursos da região para possibilitar o desenvolvimento próspero. Isto possibilita ao líder registrar seu nome na história, guiando sabiamente seu povo para o progresso e tomando as decisões que garantirão o sucesso dessa empreitada.

A cada turno o jogador avança no tempo - em escalas maiores no início do jogo e diminuindo gradativamente com o avanço deste, dominando tecnologias em suas respectivas eras, podendo ampliar seus domínios territoriais, adquirir recursos ao seu redor, conhecer outras civilizações também pertencentes a esse universo, trocar informações e adquirir cultura com cidades-estados ou outros líderes, disputando seu lugar com outras civilizações.

Fase 2: As regras do jogo
O jogo Civilization 5 lida com duas questões que são interligadas, Civilização e Progresso. Essas ideias apresentam uma percepção de História enquanto um processo linear, onde todos os povos devem passar por etapas sucessivas até chegarem a um futuro melhor, tempo esse que geralmente é percebido como destino final da civilização (HARTOG, 2017).

Essa noção de História já foi amplamente criticada e superada pela historiografia, sendo desnecessária nesse momento qualquer discussão sobre essas questões pois é lugar comum para qualquer neófito na história. Porém, em um jogo que tem como regra o domínio de tecnologias, iniciadas por determinado povo e depois conhecidas pelo restante da humanidade, e o avanço em eras (Antiga, Clássica, Medieval, Renascença, Industrial, Moderna, Atômica e Informação), passados por qualquer jogador, independente do líder ou civilização que escolha para controlar, é necessário utilizar essa definição. Nesse sentido, a utilização dessa ideia é menos o reconhecimento dela enquanto um processo natural do que a adaptação a jogabilidade.

Dessa forma, uma pesquisa sob os domínios da história deve estar em sintonia com o campo historiográfico e as artes de fazer que compõem o ofício de historiador, mas também, deve estar atenta as características que estão interligadas ao objeto de pesquisa, nesse caso, um jogo eletrônico. Em outras palavras, uma pesquisa no campo da história que tem por objetivo analisar um Jogo Eletrônico enquanto uma fonte histórica deve perceber as especificidades dessa fonte, como as regras do jogo e jogabilidade.

A relação entre História e Jogos remete ao ressurgimento de uma figura que tem pouco apreço no campo acadêmico e historiográfico, o herói (GARCÍA; AGUILAR, 2015). Controlando uma figura histórica, que serve como avatar, o jogador possuí o domínio sobre determinada civilização e guia o destino desse povo, podendo utilizar os exemplos do passado desse líder para repetir as ações históricas ou ignorar essas decisões e criar novos horizontes para o futuro dessa civilização, sem a necessidade de nenhuma relação com o passado de fato.Nesse sentido, o elemento herói deve ser percebido em uma espécie de pêndulo, oscilando entre a regra do jogo (jogabilidade) e o discurso historiográfico (crítica), em um processo incessante de não poder estar totalmente presente emqualquer dos campos, nem fugir totalmente deles.

Em uma partida normal, existem cinco formas de um jogador obter a vitória em Civilization 5:DominationVictory [Vitória por Dominação], Science Victory [Vitória da Ciência], Cultural Victory [Vitória Cultural], DiplomaticVictory [Vitória Diplomática] e Time Victory [Vitória no Tempo]. Cada uma delas com uma condição específica e adaptadas a um estilo particular de jogo, por exemplo, a Vitória Diplomática pode ser conquistada após a vitória em uma votação nas Nações Unidas e a Vitória por Tempo é obtida pelo jogador que possuir o maior número de pontos no final da partida, pré-determinada para o ano 2050 EC.

Fase 3: Simulação dos Assírios dentro de Civilization V
O líder do Império Assírio é Assurbanipal, rei assírio que viveu entre os anos 685 e 627 AEC.Em Civ 5 ele é apresentado como um homem com postura imponente, possuindo uma coroa dourada na cabeça e barbas trançadas típicas. Vestindo trajes finos azuis com detalhes dourados, um manto em tons de vermelho perpassa o corpo do líder, na altura do tronco até a parte superior do joelho direito. Além dos braceletes, a mão direita do rei destaca-se por segurar frente ao corpo um livro negro.


Fig. 2 – Ícone de Assurbanipal em Civilization V

Em Civilization V cada civilização possuí um líder próprio, dotado de características e atribuições específicas que remetem a uma determinada singularidade desse povo ao longo da história. A IA atribui a cada líder um comportamento pré-determinado, condizente com suas atitudes ao longo da vida. Dessa forma, o comportamento de Montezuma, líder dos astecas, é mais agressivo do que William, líder da Holanda, onde o primeiro opta por uma Vitória de Dominação, que é obtida na conquista dos outros líderes e povos, e o segundo tende a uma Vitória Cultural, obtida após completar políticas sociais.

As relações diplomáticas são simuladas em um encontro direto entre os líderes da civilização, sugerindo uma aproximação direta e uma participação ativa dos governantes nas tomadas de decisões. Depois da devida introdução do líder, algumas opções são apresentadas, como sugerir aliança, exigir e pagar tributo, trocar conhecimentos ou declarar guerra, cada uma com uma reação condizente com a ação escolhida pelo líder, atitudes estas na qual o jogador também está sujeito a sofrer caso a IA assim decida.

Quando o jogador decide controlar os Assírios ou encontra com essa civilização enquanto inimigo controlado pela inteligência artificial (IA) do computador, a figura de Assurbanipal é introduzida.Assurbanipal aparece em forma e local majestoso, um salão ladeado por colunas douradas que possuem na base uma figura de Shedu e, em primeiro plano,com esculturas de touros que se encontram deitados sob um recipiente onde são estocados pergaminhos, já ao fundo, um arco em lápis-lazúli com azulejos azuis brilhantes e figuras em tijolos dourados que remetem aos Portões de Ishtar.


Fig. 3 – Assurbanipal em Civilization V


Quando controlado pela IA e seguindo as regras originais do jogo, o comportamento de Assurbanipal é ambíguo, ora optando pelo lado agressivo da Vitória por Dominação, ora tentando, quando as condições se demonstram possíveis, uma Vitória por Ciência. Essas duas características comportamentais do líder Assírio são condizentes com a historiografia e remetem a duas condições presentes nos povos Assírios, o poder bélico e o conhecimento tecnológico. Para os assírios a conquista de outros povos era uma missão divina,concedida pelo deus Assur ao seu povo.E como destaca Kátia Pozzer (2017, p.119-120) é

“Através da imposição da supremacia, seja na força das batalhas ou nos adornos dos palácios, os assírios assumiam a missão divina de transformar os povos conquistados em assírios, tendo em vista que se consideravam o centro do mundo. A construção da imagem real fazia parte de um discurso impregnado de vitórias que legitimavam a assimilação linguística e cultural imposta”

Os povos conquistados pelos assírios poderiam ser assimilados ao império, tornando-se também,com o passar do tempo, assírios, trazendo para si a missão divina da conquista. Essa interpretação teológica do mundo tornava o poder militar um elemento fundamental na manutenção e administração do poder divino.

O exército assírio era organizado em termos hierárquicos e poderoso, em se tratando de aspectos bélicos, com a infantaria (Kallapu) possuindo armas de ferro, armaduras com lâminas de bronze costuradas sobre um colete de couro e a cavalaria (Susanu) com carros de guerra e arqueiros treinados, além de aríetes que colocavam abaixo qualquer cidadela fortificada, facilitando de maneira colossal as conquistas bélicas.

Em Civilization 5, as características da máquina de guerra assíria são apresentadas com a unidade Torre de Cerco, que é um aríete sobre rodas e feito de madeira, com uma torre em formato circular e a ponta da arma com uma cabeça de touro. É uma unidade única no jogo, só sendo acessível para os jogadores que escolhem jogar com os assírios.


Fig. 4 – Ícone da Torre de Cerco em Civilization V

Apesar das características bélicas dos assírios, o objetivo do expansionismo assírio não se resume a um controle bélico, mas remete a uma identidade coletiva, agrupando todos os povos conquistados sob um único rei.Como destaca Pozzer(2017, p.122)

“O objetivo estratégico de longo prazo da Assíria, portanto, não foi a criação de um império sustentado por armas, mas uma nação unida por um rei semidivino percebido como a fonte de segurança, paz e prosperidade. Este objetivo foi conseguido através de uma assimilação e integração sistemática implementada por uma política orientada para atenuar as identidades étnicas dos povos conquistados e substituí-las por uma identidade coletiva assíria”

Essa forma de assimilação do outro presente nos assírios mediante um caráter teológico, ou seja, concedido por um deus e liderado por um líder semidivino, pode ser compreendida no jogo com a habilidade Treasure of Nineveh [Tesouros de Nínive], presente exclusivamente em Civilization 5 para os assírios. Jogando com os assírios e controlando Assurbanipal, quando uma cidade é conquistada, o jogador ganha acesso a uma tecnologia desconhecida, mas que já fora descoberta pelo seu antigo dono. Ressalto também que essa habilidade só pode ser utilizada quando a conquista da cidade é realizada mediante forma bélica, não sendo possível acessar a habilidade quando a cidade é doada ou trocada com outro líder do jogo.


Fig. 5 – Mapa da extensão territorial do Império Neo-Assírio presente em Civilization V

Outra característica presente no líder dos assírios de Civilization 5 é o apreço pelo conhecimento, identificado na Biblioteca Real. Uma estrutura única que no jogo substitui a estrutura da Biblioteca, comum a todos os povos que descobrem a tecnologia da escrita. Essa estrutura remete a Biblioteca de Nínive, também conhecida por Biblioteca de Assurbanipal, abrigando mais de 20.000 placas de argila em escrita cuneiforme e, provavelmente, outros textos em formatos diversos, como pergaminhos.Tais elementos são perceptíveis no cenário onde Assurbanipal é apresentado no jogo.


Fig. 6 – Ícone da Biblioteca Real em Civilization V

Essas duas formas de comportamento, de um lado o aspecto bélico e do outro, uma aparência científica, concedem ao jogador, que decide controlar Assurbanipal e os assírios,a possibilidade de adquirir duas conquistas [achievement]. Elementos na forma de medalhas e troféus digitais que são desbloqueados quando os jogadores conseguem cumprir determinada tarefa pré-estabelecida, ampliando a dificuldade do jogo e incentivando os jogadores a tentarem opções variadas para descobrir novas conquistas.

A primeira delas, intitulada Pioneiro da Tecnologia Tablet [Tablet Tech Pioneer], é obtida quando o jogador vence o jogo em qualquer dificuldade controlando Assurbanipal. E a segunda é Conhecimento é Poder [knowledgeispower], obtida quando o jogador constrói a Biblioteca Real e treina uma unidade com promoção.


Fig. 7 – Ícones das Conquistas na Steam em Civilization V

Oscilando entre elementos que remetem à guerra e ao conhecimento, o poder dos assírios é simulado em Civilization V como uma civilização que expandirá os domínios e conquistará os outros povos como uma missão divina, em honra ao deus Assur.

Última Fase: Algumas Considerações
Para além do entretenimento, os Jogos Eletrônicos demonstram ser campos fecundos de análise, vinculando representações do passado a eventos que podem ser associados na memória coletiva do grande público.Os Jogos Eletrônicos, sobretudo aqueles com temática histórica, são peças chave de uma cultura midiática e não podem ser ignorados pelos historiadores.O conhecimento histórico presente nos jogos, seja na forma do enredo da trama ou nas representações imagéticas do passado, são temas que estão sendo abordados pela historiografia atualmente.

Como pode ser percebido o grande público relaciona-se com as diversas formas de memória de uma maneira bem distinta do historiador. Maneiras essas que devem ser analisadas e debatidas, pois o historiador não tem monopólio sobre a memória. Longe de encerrar a discussão, o que foi exposto aqui em linhas gerais, serve para suscitar ainda mais o debate em torno da relação entre História e Jogos Eletrônicos.

Referências
Hezrom Vieira Costa Limaé Mestre em História pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB,pesquisador do Grupo de Pesquisa Comunidades Virtuais – IF Baiano e docente da Universidade Paulista (UNIP), Campina Grande, PB.
Email: hezromvieira@gmail.com

CHARTIER, Roger. A história ou a leitura do tempo. Tradução Cristina Antunes, 2. Ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
GARCÍA, MaríaÁngeles Martínez; AGUILAR, Antonio Gómez. Video juego e historia: el resurgir del héroe. In: ROMERA, César Sán Nicolás; OJEDA, Miguel Ángel Nicolás. Video juegos y Sociedad Digital: Nuevas realidades de estudio para la percepción del pasado histórico. Mar del Plata: Universidad Nacional del Mar del Plata, 2015.
HARTOG, François. Crer em História. Tradução Camila Dias. Belo Horizonte: Autêntica, 2017.
KAPELL, Matthew W.; ELLIOTT, Andrew B.R. Playingwith the Past: Digital Games and the Simulation of History. New York: Blomsburry, 2013.
POZZER, Kátia. Alteridade e identidade no império Assírio. In: BUENO, André [et al.] Mais Orientes. Rio de Janeiro/União de Vitória: Edições Sobre Ontens/LAPHIS, 2017. [p.105-126]
ROMERA, César Sán Nicolás; OJEDA, Miguel Ángel Nicolás. Video juegos y Sociedad Digital: Nuevas realidades de estudio para la percepción del pasado histórico. Mar del Plata: Universidad Nacional del Mar del Plata, 2015.

Jogos Citados
Sid Meier’s Civilization V. Novato, CA: Firaxis Games, 2K Games, 2010.

11 comentários:

  1. Gostaria primeiramente de elogiar o trabalho e a excelente análise que evidencia como também é interessante utilizar os jogos eletrônicos como recursos didáticos em escolas. Quando você demonstrou a forma que o jogo traduz para sua linguagem a importância da conquista e da integração para os assírios, creio eu, que o mesmo poderia ser feito em uma sala de aula com outros temas e outros jogos.

    Uma dúvida que sempre tive quando reflito sobre os jogos que gosto e penso tecer uma análise histórica deles é quando estou ultrapassando o limite em possíveis críticas. Não sei como ser bem claro nisto, mas um jogo que eventualmente penso em escrever um artigo ou fazer minha monografia sobre tem um mapa geral com fronteiras bem definidas, tratando-se de um jogo de temática política medieval. Uma crítica seria, talvez, falar que essas fronteiras que o jogo estabelece são anacrônicas , não existia fronteiras definitivas na idade média como nos dias atuais, fronteiras exatas entre um reino e outro. Minha dúvida é como se debruçar sobre esse problema? Por um lado é um anacronismo mas é uma mecânica do jogo da qual sem ele se tornaria outra coisa, é uma linguagem que facilita, talvez, a interação do jogador com esta mídia.

    Não sei se fui muito claro, mas é isto.

    Igor Oliveira de Souza
    Universidade Federal Fluminense - UFF

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  2. Boa tarde, Igor Oliveira.

    Obrigado pela participação, seja bem vindo.
    Bom, respondendo a sua pergunta. Aqueles que desejam trabalhar e pesquisar Jogos Digitais, seja no âmbito educacional ou da pesquisa acadêmica, devem partir da premissa que eles são fontes históricas, ou seja, são objetos que foram produzidos em uma época e que invocam determinada visão de mundo. Dessa forma, todo historiador deve questionar sua fonte, fazê-la responder as seguintes questões "quem produziu? quando? por que? com qual intenção?". Respondendo essas questões é possível ampliar a potência da lupa na análise.

    Dito isso, outra questão também deve ser pensada, a questão da jogabilidade e os elementos do jogo que são necessários para o funcionamento do mesmo. Esse ponto foi levantado quando no texto utilizei a metáfora do pêndulo. Ou seja "deve ser percebido em uma espécie de pêndulo, oscilando entre a regra do jogo (jogabilidade) e o discurso historiográfico (crítica), em um processo incessante de não poder estar totalmente presente em qualquer dos campos, nem fugir totalmente deles".

    Como o objeto analisado trata-se de um jogo, ele está inserido em um conjunto de regras, sendo impossível jogar (e vencer) fugindo das mesmas. A problemática do mapa e das fronteiras (e tantos outros anacronismos presentes) deve ser elencada sim, mas também analisada, entendo a motivação e justificação do mesmo dentro do jogo.

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  3. Parabéns pelo texto caro Hezrom Vieira Costa Limaé. Sua reflexão e proposta de trazer a "gameficação", enquanto recurso didático, para as aulas de História consideramos relevante e pertinente. Uma questão que gostaríamos de refletir é sobre, "levando em consideração o contexto da escola, como inserir o game (e seus recursos tecnológicos) nesses ambientes?
    Jander F Martins e Vitória D Wingert

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  4. Olá Jander Martins e Vitória Wingert, sejam bem vindos e obrigado pela leitura.

    Existem duas possibilidades para a utilização dos jogos em sala de aula.
    Uma metodologia possível é dividir a turma em equipes, entre 2 e 5 pessoas, para que todos possam participar ativamente, e passar uma cópia do jogo para o alunado. Sugiro que uma aula seja utilizada para uma espécie de tutorial, ensinando o básico do jogo, como instalação, elementos do jogo e mecanismos. Embora o professor fique menos presente nessa questão, ela torna-se positiva porque o aluno é agente passivo do processo, vai jogar, simular e construir suas próprias experiências através da sua própria vivência.

    Outra possibilidade é jogar o jogo em sala de aula, dividindo a turma em grupos maiores, dessa forma a experiência pode ser melhor "controlada" pelo professor, embora peque porque nem todos participam ativamente do processo.

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Boa noite Hezrom,

    Parabéns pelo trabalho, conheço um pouco de suas pesquisas e vejo a importância delas para essa área no Brasil que ainda precisa caminhar muito, superando os preconceitos!
    A série Civilization por muitas décadas foi responsável por ser um dos primeiros contatos entre o tema História e os jogadores. Achei interessante o seguinte trecho em seu texto:

    "Nesse sentido, o elemento herói deve ser percebido em uma espécie de pêndulo, oscilando entre a regra do jogo (jogabilidade) e o discurso historiográfico (crítica), em um processo incessante de não poder estar totalmente presente em qualquer dos campos, nem fugir totalmente deles".

    Age of Empires é outra série bem famosa por tratar de temas históricos, e percebo que nem sempre a história é fiel, pois primeiramente a jogabilidade é um fator chave para os games. O designer de Age of Mithology, Bruce Sheller, diz o seguinte:

    A pesquisa de Age of Empires foi feita na biblioteca da comunidade local. Pesquisa extensiva e detalhada não é necessária ou mesmo uma boa ideia para a maioria dos produtos de entretenimento. Os melhores materiais de referência são frequentemente encontrados na seção de crianças porque este é o nível de interesse histórico para a maioria dos públicos de jogos. Se você construir detalhes históricos demais, corre o risco de tornar o jogo obtuso. Os jogadores devem ter a diversão, não os designers ou pesquisadores (MICROSOFT GAMES, 1997).

    Civization apresenta um Gandhi agressivo, decorrente de um bug nas primeiras versões da série. Esse “ problema” com o líder indiano se tornou tão popular que se manteve até hoje, mesmo sendo fácil corrigir esse erro. Então a pergunta é: A partir do exemplo de Gandhi, o que você pensa sobre a relação entre a "fidelidade" histórica e o entretenimento?
    Abraços!

    OBS: Tenho um artigo que pode lhe interessar, está na página 130 (não sei se eu já havia te passado esse)
    https://drive.google.com/file/d/1fh6zXjl7zyLi0nRJZWVjCIBoLWlXiZY7/view
    Pepita de Souza Afiune

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    1. Olá Pepita, seja bem vinda!
      Obrigado pela leitura do texto, suas leituras e contribuições foram bastante pertinentes, contribuindo de forma significativa para o debate.

      Utilizei a metáfora do pêndulo para o Herói mas creio que ela pode ser adaptada para o Jogo de uma maneira geral, sempre alternando entre História (e historiografia) e Jogo (regras/jogabilidade) sem fugir totalmente de um dos lados.

      Foi com o primeiro título da série Age of Empires que eu, ainda criança, despertei o interesse pela História, assim como o primeiro Civilization na época do DOS. Concordo contigo nesse quesito.

      A posição do Bruce Sheller é pertinente, sobretudo para entendermos um pouco melhor como os próprios desenvolvedores dos jogos pensam a questão da História e da Memória. Na minha opinião, quando mais "histórico" um jogo pretende ser, no sentido dos jogos educativos, pior é a experiência, porque ele fica engessado em algumas situações, impedindo ou prejudicando a experiência.

      A fidelidade dos Jogos em História é um tema recorrente na historiografia que analisa esses aspectos. Sou adepto do pensamento de Matthew Kapell e Andrew Elliott, onde para as análises históricas sobre jogos é mais interessante perceber qual visão historiográfica os produtores tiveram contato e reproduzem no jogo do que identificar os anacronismos

      Abraços, Pepita!

      PS: Parabéns pelo texto sobre os Astecas. Você ainda não tinha me mostrado, já está na minha bibliografia!

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  7. Parabéns Hezrom, seu texto ficou muito bom.
    Para você trazer esses tipos de jogos para os alunos ajudaria numa melhor compreensão sobre o assunto abordado?

    José Raimundo Neto.

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    1. Bom dia, José Raimundo Neto.

      A utilização de Jogos na educação rende frutos proveitosos. Eles podem ser utilizados como sondagem de conteúdo, uma aproximação inicial, comparação com outras fontes, atividade complementar, questionamento de versões. Basta o professor saber utilizar da melhor forma.

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