Katty Cristina Lima Sá

INSPIRADOS PELOS SHUHADA: A CONCEPÇÃO DE MARTÍRIO E A APRESENTAÇÃO DOS MÁRTIRES NA INSPIRE E NA DABIQ (2011-2016)

O presente texto objetiva apresentar a concepção martírio e o ideal de mártir formulado pela Al-Qaeda e o Estado Islâmico a partir dos necrológios publicados em suas respectivas revistas, Inspire e Dabiq. Tal temática se faz relevante ao observamos os dados disponibilizados pelo Chicago Project on Security and Threats [http://cpostdata. uchicago.edu/search_new.php. Acesso em 30 de junho de 2018] acerca da incidência de ataques suicidas em todo os continentes: entre os anos de 2001 e 2016 foram executados 5.256 atentados do tipo com autoria atribuída a grupos radicais islâmicos, que somados resultaram em 52.290 mortes. A existência de tamanho contingente de candidatos ao autossacrifício homicida parece incompreensível para aqueles que estão fora do contexto de grupos como Al-Qaeda e Estado Islâmico (EI) e, de fato, para identificar as razões que levam indivíduos a abrirem mão de suas vidas em nome de objetivos políticos unidos a crenças religiosas, faz necessário analisar conceitos que baseiam e legitimam esta ação, como jihad e shahada [martírio].

Segundo Abul-Fazl Ezzati [2014], shahada significa literalmente “testemunhar”, “tornar-se modelo”, e está obrigatoriamente ligada ao conceito de jihad. Entretanto, o autor atenta que “a maioria dos eruditos não-muçulmanos, intencionalmente ou não, definiram jihad apenas como guerra santa, de modo que não compreenderam a shahada nem a jihad” [EZZATI, 2014, p. 22. Tradução nossa]. Por isso, antes de adentrar ao objetivo deste texto, esclareceremos o que é jihad.

Asma Afsaruddin [2017] definiu essa palavra como “empenho, esforço, labor, frequentemente usada na frase ‘al-jihad fi sabil Allah’ ou ‘esforço no caminho de Deus’” [AFSARUDDIN, 2017, p.01. Tradução nossa]. A autora afirmou ainda que a maior parte das características da jihad descritas no Alcorão referem-se a aspectos não-violentos, o sábr, que devem ser constantes no cotidiano do fiel. Outra parte desse empenho é o qital, referente à atividade guerreira, mas esse é um recurso condicional, restrito a situações especificas determinadas no Alcorão, por exemplo, em resposta a agressões externas [AFSARUDDIN, 2017, p.04].

Com tudo isso, entende-se shahada como o testemunho da fé em Alá, traduzida no empenho de praticar as ações cotidianas de acordo com ensinamentos divinos passados por Maomé. Aquele cujo esforço para manter-se obediente a Deus persistiu até a ocasião de morte adquire o status de sharid [pl. shuhada], ou seja, de mártir, e se torna um exemplo para seu entorno [EZZATI, 2014, p.23-24].  Conforme destacou Ezzati, a concepção foi associada morte trágica em batalhas devido aos relatos provenientes dos primórdios do Islã, nos quais os mártires foram definidos através “da morte fatalista daqueles que são queridos por Alá” [EZZATI, 2014, p.23-24], sendo a figura de maior influência para a essa construção Hussein Ibn-Ali (626 - 680 D.C.), neto de Maomé.

Segundo a tradição islâmica, Hussein foi assassinado por não apoiar o governo de Yazid, descrito como um líder tirânico e desobediente aos ensinamentos de Deus. Esta morte foi considerada a máxima do esforço por Alá e é anualmente celebrada na Ashura, cerimônia em que se busca a salvação através do sofrimento e tristeza, sem discursos políticos ou apologia a autoaniquilação como forma de demonstração de fé [FREAMON, 2003]. Cabe ressaltar que, como ressaltou Bernard Freamon [2003], a visão de martírio construída em torno da figura de Hussein faz parte da cultura muçulmana xiita, e não possuí similares no sunismo. 

Através das considerações acima, percebe-se que tanto a jihad quanto a shahada possuem relevância dentro da religião corânica, mas não estão ligados a violência ou a fins políticos. O encontro de ambos os termos com essas características resultou de acontecimentos no fim do século XX.

Segundo Freamon [2003], o martírio de Hussein adquiriu conotações políticas no Iraque durante a década de 1970 após dois episódios. No primeiro, um grupo de intelectuais xiitas da cidade de Najaf utilizou das comemorações da Ashura de 1974 para protestar contra o governo do partido Ba’ath, que reprendeu a revolta. Com o intuito de conter a influência desses estudiosos, o governo iraquiano prendeu e assassinou do grupo, Muhammad Baqir al-Sadr,  em 1980. Tal fato foi associado e comparado ao sacrifício de Hussein e adquiriu o status de martírio [FREAMON, 2003, p.347].

Após estes acontecimentos, o ex-pupilo de al-Sadr, Muhammad Fadlallah (1935-2010) defendeu associação da shahada enquanto autossacrifício ao nacionalismo xiita, o que formou a base de pensamento do Hezbollah, grupo do qual Fadlallah foi líder espiritual. Durante a década de 1990, através da aproximação do grupo libanês com nacionalistas palestinos, a concepção de martírio e sua aplicação para definir ataques suicidas saíram do âmbito da militância xiita e alcançaram os movimentos como o Hamas e as Brigadas Al-Aqsa, que realizaram uma série de atentados suicidas contra alvos israelenses. 

Ainda que a concepção de martírio enquanto autossacrifício provenha do xiismo e tenha sido empregada por grupos nacionalistas islâmicos sunitas, foi com ascensão do jihadismo internacional que a utilização do atentado suicida, bem como o culto a morte, tornaram-se constantes. Da quantidade de ataques suicidas realizados entre 2001 e 2016, citadas no inicio deste texto, cerca de 45% foi realizado pela Al-Qaeda ou pelo Estado Islâmico [CHICAGO PROJECT ON SECURITY AND THREATS, 2018]. 

Lembramos que, embora possuam elementos provenientes do Islã em seus discursos, grupos como o Hezbollah, Hamas, as Brigadas Al-Aqsa não são considerados jihadistas, mas nacionalistas islamitas [MOGHADAM, 2009]. Isso porque a concepção de “guerra santa”, contra inimigos infiéis tem pouca importância para estas entidades, cujas demandas principais são referentes a assuntos nacionais.

Diferente disso, Al-Qaeda e Estado Islâmico se colocam como jihadistas, uma vez a jihad, entendida em termos militares, é fundamental para seu plano de ação. Uma característica relevante destes grupos, que seguem a vertente sunita salafista do Islã, é a intolerância com aqueles que não partilham de suas concepções, o que inclui muçulmanos xiitas. Ainda assim, eles assumiram e ampliaram a noção de martírio proveniente dos pensadores xiitas e legitimada por estudiosos sunitas como forma de apoiar a resistência palestina. Após isso, não apenas se tornaram os maiores praticantes de ataques suicidas [MOGFADAM, 2009, p. 02], como passaram a definir a morte de qualquer um de seus ativistas, seja por autoaniquilamento ou não, como shahada.

Para as duas organizações jihadistas, ampliar a extensão do conceito de martírio e glorificar qualquer morte de seus ativistas possui forte apelo motivacional, visto que participar da luta armada implica em uma alta chance de morrer violentamente, seja em virtude da execução de um ataque, de modo proposital ou não, ou em ações por parte dos Estados para coibir práticas terroristas. Por isso, tanto na Inspire como na Dabiq, o tema da shahada é abordado constantemente e os “mártires” são figuras exaltadas.

A Inspire e a Dabiq são revistas eletrônicas escritas em inglês e disponibilizadas para download em PDF. Nestas, o grupo jihadista responsável por sua produção expressa seus objetivos, táticas, alvos e inimigos, sempre justificados através de uma leitura extremista dos textos sagrados islâmicos.  O primeiro dos periódicos citados foi produzido pela Al-Qaeda da Península Arábica (AQPA) entre junho de 2010 e julho de 2017 e possui dezessete números.  A Dabiq, por sua vez, foi lançada em junho de 2014, pouco após o Estado Islâmico se autoproclamar um Estado Westfaliano governado através da sharia [conjunto de leis islâmicas], e conta com quinze edições, sendo a última de julho de 2016. 

Em ambas as publicações, a temática do martírio foi discutida em diversas ocasiões, como em poemas que glorificam a morte ou durante artigos acerca da ideia de obrigatoriedade em participar da jihad proclamada por cada organização. Neste trabalho, focaremos apenas nas secções nas quais são publicados necrológios para aqueles considerados “mártires”, intitulada na Inspire de “Shuhadâ' Arabian Peninsula” [Mártires da Península Arábica] e na publicação do EI como “Among the belivers are a man” [Entre os fiéis há um homem].

Na revista da AQPA, a secção foi lançada na oitava edição, referente ao último trimestre de 2011, com três homenageados, e persistiu apenas no número seguinte (2012), em que se publicaram outros dois necrológios. Cada texto foi assinado por um autor específico, que escreve sobre o “mártir” homenageado a partir de suas experiências com este, de modo que não existe uma estruturação textual padrão.  Na Dabiq, a secção análoga surgiu no sétimo número (2013) e esteve presente até o décimo quinto, o último lançado (2016). Na grande maioria dos números apenas um caso foi retratado e não há indicação de autoria dos textos, que por sua vez obedecem a seguinte estrutura: a) noum de guerre; b) nacionalidade; c) ocasião da imigração para os territórios do EI; d) virtudes individuais; e) batalhas e circunstância da morte. 

Nas duas revistas foram retratados apenas homens mortos dentro dos campos da organização da qual eram integrantes e em virtude de ataques inimigos. Nenhum dos “mártires” homenageados pereceu por conta de ataques suicidas. Todavia, existe uma diferença entre os periódicos: na secção da Inspire são apresentados integrantes dos escalões mais altos da AQPA, como o comandante Abu Ayman (?-2011) [INSPIRE, nº08, 2011, p.13-15] e o responsável pelo setor midiático do grupo, Samir Khan (1985-2011) [INSPIRE, nº09, 2011, p.14-19],  enquanto  a Dabiq traz perfis diversos. Dos nove “shuhada” apresentados apenas Abdur Rauf Khadin (1982-2015), ex-comandante do Talibã [DABIQ, nº 13, 2016, p.30-31], e Mohammad Emwazi (1988-2015), conhecido como “Jihad John” e antigo participante de células jihadistas europeias [DABIQ, nº 08, 2015, p.22-23], possuíam trajetórias longas na militância jihadista. Por estas informações, percebemos a importância do “sharid” como divulgador da imagem que cada grupo projetou sobre si. 

Para Al-Qaeda, e consequentemente para a AQPA, existe uma ideia de tradição em sua missão, ou seja, no ideal que explica sua existência [STERN, 2004]. Isso se deve ao histórico da organização fundada por Osama Bin Laden (1957-2011) em 1989, cujo atual quadro de liderança provém de contextos como o da Guerra Soviético-Afegã (1979-1989) e das invasões americanas no Afeganistão (2001-) e Iraque (2003-). A AQPA, considerada por analistas como Katherine Zimmerman [2013] a franquia mais próxima em tática e ideologia do núcleo da rede, coloca-se como portadora deste legado. Esta característica pode explicar as razões pela quais a revista do grupo homenageia seus mortos mais proeminentes através das palavras de outras figuras de destaque, como é o caso do clérigo extremista e editor da Inspire Anwar al-Awlaki (1971-2011), cujo o necrológio foi assinado pelo porta-voz da franquia, Haridh al-Nadhari (?-2015).

Enquanto a Inspire ressaltou a trajetória longínqua da Al-Qaeda, a  Dabiq apresentou através de seus shuhada a novidade que o Estado Islâmico tentou demonstrar. Este consiste em um dissidente da rede criada por Bin Laden que, após promulgar o Califado em 2014, utilizou-se dos mais recentes meios de comunicação para fomentar adesões, em especial das redes sociais como o Twitter, Facebook e Telegram. Embora parte do seu alto comando remanescesse do período em que o grupo se denominava Al-Qaeda do Iraque, os rostos que representavam o EI na Internet eram jovens e de nacionalidades distintas, que procuravam suscitar filiações através da imagem do “Califado” multiétnico, indiferente das diferenças culturais de seus membros, pois o que os uniria era a homogeneidade religiosa [WOOD, 2017].  Com isso, não foi por total acaso que as nacionalidades dos “mártires” apresentados na Dabiq não se repetiram.

Além de divulgar a imagem que a Al-Qaeda, representada pela AQPA, e o Estado Islâmico desejam projetar de si, a noção de martírio e o perfil dos mártires apresentados pela Inspire e Dabiq são instrumentos para atrair ativistas e  compensá-los pela possível perda de suas vidas. Não se pode deixar de citar as promessas de recompensas post mortem existentes em torno do martírio, que incluem salvação para a família do “sharid” e o ingresso deste no Paraíso, onde ele terá a sua disposição setenta e duas virgens e a mesma proximidade de Deus conferida aos profetas, nem que uma das características mais importantes do mártir é servir como exemplo de virtude.

Os atributos envoltos na construção dos “shuhada” apresentados pela Dabiq e pela Inspire não possuem diferenças significativas, de modo que, ao analisarmos os nove necrológios publicados na primeira revista e os cinco da segunda, encontrados recorrência das seguintes características: a) alegria; b) amizade; c) anseio pelo martírio; d) coragem; e) conhecimento e retidão religiosa; f) generosidade. Cada um dos “mártires” possui em média três dessas “virtudes”, sendo as mais recorrentes em ambas as publicações o anseio pela morte, a coragem e o conhecimento religioso, como pode ser visto nos trechos abaixo:

Anseio pela morte
“Abu Ayman era corajoso e conhecido por perguntar a seus irmãos se lhe era permitido realizar uma operação de martírio. Esse era seu amor por Deus e seu desejo de lutar contra os inimigos de Deus. [...] encontrei-me com Xeque Ibrahim al-Rubaish e ele me contou que conheceu Ayman duas horas antes de seu martírio. Este sorriu e pediu a alguns irmãos que se juntassem a ele para ir à linha de frente” [INSPIRE, nº 08, 2011, 14. Tradução nossa] 
“Hudhayfah era dentista, mas não sonhava com riqueza e estima como muitos médicos. Ele nunca viu deleite e relaxamento em outra coisa se não a jihad. Ele nunca percebeu a felicidade em outra coisa se não o martírio” [DABIQ,nº 09, 2014, p.40. Tradução nossa]. 

Conhecimento e retidão religiosa
“Sheik Anwar estava ciente do fato de que a legitimidade do entendimento está no Alcorão e na Suna, então ele aderiu ao Alcorão e ao seu aprendizado. A respeito disto, ele recebeu o ijazah [licença para o ensino] na nobre citação do livro sagrado [...] ”  [INSPIRE, nº 09, 2011, p.09. Tradução nossa]
“Ele [Abu Quadamah al-Misiri] se tornou um homem diferente na sequência da morte de seu amigo. Estava mais focado em suas práticas religiosas [...] apesar de sua lesão grave na cabeça, com a parte de trás do crânio totalmente fraturada, Quadamah proferiu repetidamente o shahadatayn [declaração de fé e da unicidade de Alá] até a sua última respiração” [DABIQ, n° 07, 2015, p.47. Tradução nossa]. 

Coragem 
“Mesmo sendo gentil em sua vida diária gentil [Abu Ayman] era rígido e firme nos campos de batalha. Em sua casa eu o conhecia como muito bondoso, humilde e servente aos seus irmãos, e eu o vi no campo de batalha como um leão de coragem com uma presença que irradia firmeza em quem está ao seu redor” [INSPIRE, nº 08, 2011, 14. Tradução nossa]
“Após a libertação de al-Khayr dos Sahwah, Abu Já’far foi para Ayn al-Islam, onde conheceu sua coragem. Ele esteve uma vez na casa em que houve um bombardeio da coalizão e todos no local foram mortos, mas outro irmão conseguiu tirá-lo dos escombros e Já’far foi direto lutar contra o PKK [Partido dos Trabalhadores do Curdistão]” [DABIQ, n° 11, 2015, p.38. Tradução nossa]. 

A partir da ressalva de tais características, tanto a Inspire quanto a Dabiq procuram criar a imagem do “sharid” como alguém ciente dos dogmas que regem sua religião, dotado de uma boa saúde mental, satisfeito e alegre com seu destino. Para Mohamed Hafez [2008], isto se deve ao intuito de representar os “mártires” como muçulmanos exemplares e não como pervertidos, coagidos ou submetidos a processos de lavagem cerebral, afirmação que remete ao significado de shuhada expresso no inicio deste texto, ou seja, como testemunho de fé e dedicação religiosa.
Os traços utilizados para expor as virtudes responsáveis por   transformar os jihadistas da Al-Qaeda e do Estado Islâmico “mártires”, e em exemplos a serem seguidos, não foram escolhas aleatórias e não estão baseadas somente em preceitos singulares de cada organização. Elas estão baseadas em modelos provenientes da religião, mais especificamente do martírio de Hussein. Para esclarecer tal afirmação, faz-se necessário compreender a noção de Pathosformeln, ou “fórmula para representar emoções”, utilizado por Carlo Ginzburg [2014] em seu estudo acerca do quadro “Marat em seu último suspiro”, de Jacques-Louis David [1793].

Em sua obra, David representou Jean-Paul Marat (1743-1793) através de uma “linguagem clássica e sotaque cristão” [GINZBURG, 2014], ação que aproximou o representado na tela dos mártires cristãos. Segundo Ginzburg [2014], a utilização de elementos provenientes da iconografia religiosa por grupos seculares se faz em razão de motivações políticas, de tal modo que:

“Sempre que possível, o poder secular se apropria da aura (que também é uma arma) da religião. É uma tentativa que tem suscitado respostas muito diferentes, dependendo dos interlocutores e das circunstâncias: desde ofertas de conciliação mais ou menos explícitas até as respostas violentas dos fundamentalistas” [GINZBURG, 2014, p.39].  

Enquanto David representou Marat como um mártir político a fim de legitimar a República recém-instaurada, os grupos jihadistas do século XXI apresentam seus mortos como shuhada em referência a figuras como Hussein, ainda que seu nome não seja evocado, para justificar suas ações como parte de uma “guerra santa” e compensar aqueles que de alguma forma sacrificaram suas vidas pela crença de participarem de uma jihad. Para verificar a semelhança entre os “mártires” da Inspire e da Dabiq com figuras do passado islâmico, tomemos a fala do estudioso muçulmano xiita Muhammad Salahudin [2014] acerca do significado do martírio de Hussein:

“Imã Hussein exaltou o status e a realidade do testemunho, tornando-se um símbolo de coragem e sacrifício para os oprimidos [...] [seu] nome excitou o espírito de coragem e resistência em face as forças do mal, e nos ensinou a viver pelo sacrifício de nossas vidas” [SALAHUDIN, 2014, p.49. Tradução e grifos nossos].

Esta aproximação dos “mártires” jihadistas com ícones da história islâmica, reverenciados por uma divisão do Islã que é perseguida pela Al-Qaeda e pelo Estado Islâmico, são adaptadas a realidade das duas organizações para legitimar o preceito de que ambas lutam uma autentica jihad. Ao nomear suas militâncias como uma “guerra santa”, os grupos procuram colocar suas demandas políticas extremistas como ordens religiosas que devem ser seguidas pelos “verdadeiros muçulmanos”. 
Por fim, o sharid atua como um articulador de ideais políticos e religiosos, e como uma inspiração para que novos ativistas também sacrifiquem suas vidas sem preocupar-se de que outros pereçam devido as suas ações. Mesmo após de morto, o jihadista transformado em mártir é capaz de apresentar aquilo que a organização que representa pensa de si mesma através de textos que circulam livres pela internet na Inspire e na Dabiq.

Referências
Katty Sá é mestranda em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGHC/UFRJ) e bolsista CAPES. Possui graduação em história pela Universidade Federal de Sergipe, integra o Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS) e é secretária da revista Cadernos do Tempo Presente [ISSN: 2179-2143]. E-mail: katty@getempo.org. Orientador: Dilton Cândido Santos Maynard (DHI/UFS – PPGHC/UFRJ)

Fontes
AL-BANNA, Ibrahim. The martyrdom of the Commander Abu Ayman. In: AL-MALAHEM MIDIA . Inspire Magazine – Targeting Dâr al-Harb populations, nº8, 2011, p.14-16. 
AL-ABBAS, Abu. Muwahid: Pious, Hospitable & Stouthearted. In: AL-MALAHEM MIDIA . Inspire Magazine – Targeting Dâr al-Harb populations, nº8, 2011, p.17.
AL-NADARI, Harith. My life with Al- Awlaki. In: AL-MALAHEM MEDIA . Inspire Magazine – Wining on the ground. nº 09, 2011, p.09-13.
YAZEED, Abu. Samir Khan: the face of joy. In: AL-MALAHEM MEDIA . Inspire Magazine – Wining on the ground. nº 09, 2011, p.09-13.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man: Abu Quadamah. In: Dabiq – Fom hypocrisy to apstasy: the extinction of garyzone, nº 07, janeiro de 2015, p.46-49.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man: Sheik Abu Talhah. In: Dabiq – Sha’ria alone Will rule Africa, nº 08, março de 2015, p.30-31.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man:Hudhayfah al-Battawi.  Dabiq – They plott and Allah plots, n° 09, maio de 2015, p.40.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man: Abu Umar al-Tunisi. In: Dabiq – The Law of Allah or the laws of man, nº 10 julho de 2015, p.41.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man: Abu Jafar all-Amani. In: Dabiq – From the battle of Al-Ahzab to the war of collitions, nº 11, setembro de 2015,p.38.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man: Abu Shurayh as-sislani. In: Dabiq – Just Terror, nº 12, novembro de 2015, p.55-58.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man: Mohammad Emwazi. In: Dabiq – The Rafidah: from Ibn Sabba to the Dajjal, n° 13, janeiro de 2016, p.22-23.
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man: Abu Jandal al-Bengali. In: Dabiq – The murtadd of the Brotherhood, nº 14, abril de 2016, p.50-54. 
ALHAYAT MIDIA. Among the belivers are a man:Abu Abdullah al-Candi/ Ibrahim al-Canadi. In: Dabiq  -  Break the Cross, n° 15, julho de 2016, p.70-73. 

Bibliografia
AFSARUDDIN, Asma. Orientalist, militants, and the meanings of jihad. In: Renovation – the journal of Zaytuna College [página da web]. Disponível em: https://renovatio.zaytuna.edu /article/orientalists-militants-and-the-meanings-of-jihad.  Acesso em: 16 de junho de 2018.
EZZATI, Abul-Fazl. The concepto f martyrdom in Islã. RIZVI,S. Manzoor [org]. Unique sacrifice of Iman Hussein for humanity. Nova York: Messange of peace INC, 2014, p. 21-28.
FREAMON, Bernard. Martyrdom, suicide, and Islamic Law of War: a short legal History. In: Fordham International Law Journal, vol. 27, nº 01, 2003, p.299-370.
GINZBURG, Carlo. David, Marat: Arte, política e religião. In: Medo, reverência e terror: Quatro ensaios de iconografia política. São Paulo: Companhia das Letras, 2014 [versão digital].
MOGHADAN, Assaf. The Salafi-Jihad as a Religious Ideology. In: Combate Terrorism Center Magazine – CTC Sentinel, vol. 01, nº 03, 2008. Disponível em: https://ctc.usma.edu/the-salafi-jihad-as-a-religious-ideology/. Acesso em 05 de julho de 2018.
SALAHUDIN, Muhammad. Iman Hussein: the martyr. In:  RIZVI,S. Manzoor [org]. Unique sacrifice of Iman Hussein for humanity. Nova York: Messange of peace INC, 2014, p. 41-50.
STERN, Jessica. Terror nome de Deus: porque os militantes religiosos matam. São Paulo: Barcarolla, 2004.
ZIMMERMAN, Katherine L. AQAP’s Role in the al Qaeda Network, 2013.. Disponível em: http://www.criticalthreats.org/sites/default/files/pdf_upload/analysis/Zimmerman_AQAPs_Role_in_the_al_Qaeda_Network_September_2013.pdf. Acesso em 27 de novembro de 2017.
WOOD, Grame. A Guerra do fim dos tempos: o Estado Islâmico e o mundo que ele quer. São Paulo: Cia das Letras, 2011.

Sites
CHICAGO PROJECT ON SECURITY AND THREATS. Suicide Attack Database. Disponível em: http://cpostdata. uchicago.edu/search_new.php. Acesso em 30 de junho de 2018.


3 comentários:

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  2. Bom dia! Gostaria de parabenizá-la pelo seu excelente texto com uma abordagem muito interessante sobre o ideário destes grupos. Segue abaixo minha pergunta:

    A partir do momento que o indivíduo adere aos ideais empregados pela Al-Qaeda e Estado Islâmico envolvendo a "guerra santa" representadas por tais grupos radicais, tornar-se um "mártir" jihadista acaba sendo um destino em comum a todos os envolvidos ou existe algum tipo de hierarquia/critério que selecione aqueles diretamente envolvidos nos ataques suicidas?

    Paulo Victor Cardoso Santos

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    1. Prezado Paulo,

      Em primeiro lugar agradeço o interesse e a leitura do meu texto. Não há fontes que indiquem a existência de uma hierarquia ou padrão para a escolha de atacantes suicídas. Ao analisar as características daqueles percebemos a multiplicidade de perfis: há homens, mulheres (ainda que em menor número) e até mesmo adolescente e crianças. O nível escolar também é variável de níveis mais elevados como é o caso de Mohammed Atta, um dos sequestradores do 11/09, que estudou em universidades alemãs, até pessoas de pouca instrução.
      Não podemos desconsiderar também os chamados "lobos solitários" que não são formalmente integrantes de organizações jihdistas, mas que realizam ataques terroristas em seu nome, estes são lembrados principalmente na Inspire e nomeados como mártires.

      Com isso, acredito que a concepção de martírio utilizada por grupos da mesma índole do Estado islâmico e da Al Qaeda, com toda abrangência do termo, tenha mais o papel de "propaganda", pois ela justifica e torna positiva a morte de pois ela justifica e torna positiva a morte de seus ativistas e ainda os colocas como heróis e bons islâmicos, merecedores do paraíso.

      Espero ter sanado suas dúvidas, e peço que casos elas persistam, o senhor entre em contato novamente. Estarei à disposição.

      Atenciosamente,

      Katty C. Lima Sá

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